Olhares vagos dizem mais que qualquer palavra de desprezo

domingo, 28 de novembro de 2010

My way

Minha vida às vezes parece uma cena de filme cuja trilha sonora é uma sonata triste. Sempre sobra a taça, o cigarro e eu mesma na mesa. Atrás da cortina de fumaça que paira no ar, vejo os olhares observadores pousados sobre mim. Me sinto frágil vendo casais felizes e amigos barulhentos com tanto pra compartilhar, enquanto eu estou ali, preenchendo sozinha o meu vazio. Tentei falar com ele, just one million times, somente para ouvir a mesma mensagem: deixe o seu recado. E fui ficando ali, me alimentando de outras alegrias e segurando as lágrimas que teimavam em estragar a minha maquiagem.
Não pensei em pedir socorro, só queria ficar ali, imaginando como seria se ele aparecesse e olhava insistentemente para a entrada do restaurante, como se a qualquer momento pudesse ter uma surpresa. Pedi o jantar sozinha, tomei o espumante sozinha, fumei todos os cigarros sozinha e voltei para casa sozinha novamente. O ritual que fiz horas antes, refiz ao contrário, até me encontrar despida na frente do espelho e lembrar de Teresa.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Euclides volta a abandonar

Se é pra ser sincero, assumo que não gosto dessa vida. Talvez eu seja um insatisfeito que se mata na labuta, sonhando com coisas que nunca poderá alcançar. Não invejo aqueles que passeiam em iates e passam férias no Caribe, mas me agradaria muito viver às margens da lei e da ordem, como os hippies que moram na praia e encontram na simplicidade o real significado da felicidade. Por mim, poderíamos simplesmente voltar para o Éden, aquele jardim magnífico onde vivia Adão antes de Deus inventar Eva, que por incrível que pareça, deixou uma marca eterna em todas as mulheres que habitam essa Terra.
Não encarem isso como ofensa, longe de mim, mas não é verdade que a mulher pode ser a fortuna ou a desgraça de um homem? Foi assim mesmo que aconteceu na época da criação. Eva foi a fortuna de Adão. Companheira que findou a solidão daquele homem naquele imenso paraíso, mas também foi a sua desgraça, pois conquistou sua confiança, guiou-o pelos caminhos que o levaram para longe de seu pai e de quebra engravidou dele; duas vezes. Em resumo: Adão foi deserdado, precisou trabalhar o resto da vida e ainda sustentar dois filhos, até que um matou o outro, mas isso já é outra história.
Essa conversa deveria ter significado algo, mas a única coisa que eu fiz mesmo foi demonstrar uma teoria maluca onde Eva é a grande meretriz da História da Humanidade. A verdade é que quando carregamos uma culpa, temos o costume de transferi-la para as costas de um terceiro e no meu caso, a vítima foi Eva.
Ao contrário de mim, Euclides não transferiu a sua culpa, mas assumiu bravamente ela por inteiro. Não sei dizer se foi realmente por coragem ou autopiedade. Balançou a cabeça positivamente para todas as acusações proferidas por Janeth. Talvez eu tenha errado em acreditar que tenha sido coragem ou autopiedade, talvez Euclides tenha aceitado toda a culpa por submissão. Acredito ter sido totalmente mortificante para o seu ego, mas convenhamos que de tão mal alimentado com o passar dos anos, é até difícil acreditar que tenha se manifestado. Apesar de não saber mais detalhes, acredito que foi nesse mesmo dia que ele decidiu fazer o que sempre foi bom em fazer: abandonar. Apesar do ato simples que pode parecer o de assumir uma culpa, á isso não parecerá simples em momento algum na vida de Euclides. Repito: ele sempre foi bom em abandonar. O abandono é o eterno retorno da sua História, é o que traz à tona toda a metralha e tudo o que não pode desaparecer, assim como acontece na ressaca do mar.
Euclides abandonou a sua tirana Janeth acreditando ter-lhe feito um grande favor - não abandonando - casando-se com ela. O abandono trouxe de volta a força do seu ego e junto com ela a euforia da liberdade. Largou tudo o que tinha; o que não era seu e até o que era seu por direito. Deixou para trás também seus filhos, que apesar de serem "seus", eram cópias fiéis de Janeth; pequenos tiranos.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Euclides já foi jovem

E foi assim que nasceu o primeiro filho de Euclides: sem pai. Sempre foi um garoto irresponsável, libertino e galanteador. Não tinha talento pra coisa alguma, mas sabia fazer muito uso da palavra. Apesar da má fama, era querido, um badboy engraçado. Era estimado pelas crianças, pelos velhos que sempre auxiliava em um serviço aqui ou lá, e até pelos pais das garotas que o queriam longe de suas filhas. Algo realmente sem explicação.
O que não esperava ele, é que a brincadeira de repente tivesse ficado séria demais e agora, Marília estava lá, fitando-o com aquele olhar endagador, cheio de lágrimas, prestes a despencar de seus olhos como a água que despenca de uma cachoeira. Euclides não conseguia pensar em nenhuma solução inteligente para o seu problema. Ele era apenas um garoto e Marília, uma garotinha.
- O que vamos fazer? - Marília perguntou a Euclides, visivelmente desesperada.
Euclides não respondeu e apenas lançou a Marília um olhar que era misto de medo e pavor, se é que seja possível. A primeira coisa que passou em sua mente é que seria obrigado a desposar Marília, mas não era isso que ele desejava para sua vida. Ela era muito bonitinha, muito docinha, muito bobinha. Sem falar que Euclides não conseguiria passar a sua vida inteira na sua pacata cidade natal. Ele era um garoto destinado às grandes cidades, às grandes pessoas, a grandes sucessos. Ao menos, era assim que sentia.
Precisava de alguma forma se livrar de Marília e sua gravidez, mas como? Simplesmente não havia como. Mas havia uma forma de Marília e sua gravidez serem livradas de Euclides. E junto com essa forma, descobriu Euclides que não era um garoto tão sem talento assim.

domingo, 8 de agosto de 2010

O casamento de Euclides II

Nascia mais um dia de garoa pela janela do quarto de Euclides. Com o travesseiro por cima da cabeça, ele ignorava o toque do despertador. Achava-se impaciente naquela manhã e só de imaginar ter de olhar a cara de Janeth no café-da-manhã, seu estômago embrulhou-se.
Casou-se por interesse e nada mais. Foi a clássica união da fome com a vontade de comer. Janeth já beirava os trinta e ainda estava na prateleira. Euclides não tinha nada além da sua beleza jovial e seu sorriso encantador. Como nem tudo é perfeito, Janeth cansou-se de não ser amada e Euclides cansou-se de nem tentar. Se aturavam dia após dia, conversando apenas o trivial e se vendo quanto menos fosse possível. Dividiam uma casa, uma cama e um filho. Nada mais que isso; todo o resto pertencia a Janeth. Euclides continuou tendo nada além de seu sorriso encantador, pois a beleza jovial já havia expirado o prazo de validade. Não era mais galante, nem cheio de si. Não tinha mais a velha mania de ser o maestro do tempo; na atual conjuntura, acontecia o contrário: o tempo era o maestro de sua vida. E as chuvas se tornaram cada vez mais escassas.

domingo, 11 de julho de 2010

Recordar é viver

Há dias na vida em que você precisa parar e olhar ao redor. Sentar no chão e examinar minuciosamente tudo o que acumulou durante o passar dos anos. Papéis, cartas, fotos, boletins da época de colégio, o presente de um ex-namorado, lembranças de uma viagem, enfim, tudo aquilo que ocupa um grande espaço no seu mundo. Não importa quanto tempo vai levar, é uma experiência única. Existem recordações que ficam guardadas durante muito tempo, até você esquecer que elas existem, mas no momento em que você as descobre, causam um turbilhão de emoções, tanto boas quanto ruins, mas que funcionam como uma retrospectiva que te mostra que o tempo realmente corre em mão única, sem dar chance de voltar ou consertar coisa alguma; que o que não tem remédio, remediado está e sofrer não vai fazer diferença, só vai fazer você perder muitas coisas que a vida ainda pode te proporcionar.

Nem tudo deve ser poupado. Algumas coisas devem ir parar no lixo. Quem precisa de provas velhas? Canetas que não funcionam? Cds arranhados? Uma caixinha de música que já nem tem mais bailarina? Jogar coisas fora é o primeiro passo para dar um novo passo na estrada do tempo. É o sinal de que uma reforma íntima começou. Dar fim ao antigo e buscar o novo. Mas não se livre de tudo. Guarde ao menos uma caixa, bem no fundo do seu armário com tudo o que te faz lembrar de momentos especiais e pessoas especiais. Um dia quando se sentir triste, essas recordações te darão forças pra seguir adiante e viver novos momentos que podem se juntar aos antigos, não só dentro da sua caixa, mas no seu coração.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Papo qualquer coisa

É engraçado como a gente descobre que nunca é maduro o bastante; que nada que você construiu sobreviveu à sua ignorância.Quem morre feliz não foi sábio; pois não soube refletir nem no fim da vida que nunca foi maduro o bastante para ser feliz. É difícil para alguns poder entender a cabeça de alguém, só que mais difícil do que isso, é poder entender e não poder ajudar.Quanto mais a gente vive, mais a gente morre; com a exceção dos pobres de alma.Viva e deixe viver. Talvez descobrir o mistério que envolve a vida só seja bom quando você não puder mais vivê-lo. Será que existem aqueles que enxergam a hipocrisia, a degradação da alma, a devastação dos sentimentos, e acabam entendendo que a vida não é um privilégio? Para certas pessoas, a vida é um castigo.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Mente sã.

O meu passatempo preferido sempre foi pensar. Depois que aprendi a escrever, virou escrever. Mas nunca achei suficiente; queria desenhar, cantar, dançar, enfim, ter um talento especial. Pouco tempo depois, meu passatempo preferido passou a ser observar. Foi daí que percebi que muitas pessoas não pensam e outras até escrevem, mas sem pensar. Agora, toda vez que penso, me sinto especial.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Um casal

Ela disse não, ele também disse não.
Falaram ao mesmo tempo e sobre a mesma coisa.
Pararam de fumar e voltaram a beber. Viajaram juntos, dormiram juntos e acordaram separados. Dividem o mesmo carro, mas só ele dirige.
Gostam de comer, mas só ela cozinha. Acreditam em Jesus, mas não em Deus.
Não choram vendo filmes e não gostam de ler livros. Ele come o cereal e ela toma o leite.
Ele dá o pão e ela põe o queijo. Ela lava a roupa e ele veste.
Ele dorme fora e ela usa a cama. Não tem filhos ou animal de estimação.
Não estimam um ao outro. Ele volta a fumar e ela não para de beber.
Não têm família. Ele tem amigas, ela tem amantes.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Dar não é fazer amor - parte I

Dar é dar.
Fazer amor é lindo, é sublime, é encantador, é esplêndido.
Mas dar é bom pra cacete.
Dar é aquela coisa que alguém te puxa os cabelos da nuca...
Te chama de nomes que eu não escreveria...
Não te vira com delicadeza...
Não sente vergonha de ritmos animais. Dar é bom.
Melhor do que dar, só dar por dar.
Dar sem querer casar....
Sem querer apresentar pra mãe...
Sem querer dar o primeiro abraço no Ano Novo.
Dar porque o cara te esquenta a coluna vertebral...
Te amolece o gingado...
Te molha o instinto.
Dar porque a vida é estressante e dar relaxa.
Dar porque se você não der para ele hoje, vai dar amanhã, ou depois de amanhã.
Tem pessoas que você vai acabar dando, não tem jeito.
Dar sem esperar ouvir promessas, sem esperar ouvir carinhos, sem
esperar ouvir futuro.
Dar é bom, na hora.
Durante um mês.
Para os mais desavisados, talvez anos.

Luís Fernando Veríssimo

terça-feira, 18 de maio de 2010

Quando se perde uma vida

Não esperei que fôssemos chegar àquele ponto. Sempre dizem que as mulheres tem uma sensibilidade apurada, uma espécie de sexto sentido. Mas isso, eu não pude sentir. Não que eu me sinta inútil, mas a gente sempre tem aquela sensação de: "eu poderia ter feito alguma coisa por ele", quando na verdade não poderia. Ninguém poderia.


Tentei seguir toda a orientação que me passaram. Distraia-o. Faça-o cair em si. Não faça movimentos bruscos. Ative as boas lembranças em sua memória. Lembre-o das coisas belas da vida. Chore se for necessário. Não precisei usar lágrimas como estratégia, seria inevitável controlá-las.

Fiz perguntas idiotas, apelei, implorei. Eu me ajoelhei.

As pessoas dizem que os traumas se curam, que as dores passam e os maus momentos viram só lembranças lá no fundo da memória. Acho que só a experiência pode me dar à certeza de que preciso.

Aquele foi um dos momentos mais bonitos de minha vida. Não tem nada a ver com aquela ladainha de renovação espiritual, ou acontecimento traumático que te leva até Jesus, foi somente o momento mais sincero que eu já presenciei. Eu pude ver o fundo de sua alma através dos olhos. Eles estavam mais escuros do que de costume, pareciam negros, de tão fundos. Pareciam um poço. Tentei enxergar um resto de vida lá dentro, mas foi inútil. Foi quando desisti. Apenas lhe fiz uma pergunta. A mais idiota de todas as perguntas e que se eu fosse ele, não responderia.

"Por que estás abrindo mão da vida?" - eu perguntei. E ele me perguntou o que eu achava que era vida.

Eu respondi, é claro, na luz do desespero, mas pensando melhor, talvez não tivesse precisado. Sua intenção não era realmente saber a minha opinião. Foi uma pergunta que serviu de resposta eficiente. Sempre admirei isso nele.

"Vida é estar vivo, pra amar, ser feliz etc" - foi o que eu disse. Idiotice, confesso, mas não surgiu nada melhor na hora. Foi aí que eu enxerguei o poço em seus olhos e percebi que para aquela alma não havia mais retorno. Seco. Era assim que ele estava por dentro. Então me calei e deixei-o fazer. Só acho que não deveria ter sido daquele jeito. Ele era tão bonito...

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Monólogo

Aqui é o reino do fracasso. Fracasso de tudo o que é belo aos olhos e agradável aos ouvidos. A dor aqui é silente, sussurrante no máximo. As flores são brancas e as nuvens, negras. O céu é perto e o mar é longe. Os passos são curtos, temerosos, enquanto o perigo é iminente e mortal; vive à espreita. Não existe afeto ou qualquer forma de carinho; o que se vive aqui é a mais pura das solidões, que por ser completa, embriaga. Embriaga até que mata. Mata vagarosa, de morte morrida sem sentir, sem dor no peito a aflingir. Mata silenciosa, sem grito pra ouvir nem lágrima pra chorar. Não existe sofrimento aqui, no reino do fracasso.

domingo, 28 de fevereiro de 2010

O EXCELENTE ESCRAVO FIEL

D. Leopoldina, viúva, dona de muitas terras, muitos negros e muitos filhos, ao folhear “A Província de São Paulo”, vê um anúncio muito atraente que tratava da venda de um crioulo novo e cheio de predicados. A preta Chica, já velha, não agüentava mais todo o peso do serviço doméstico.


O nome do crioulo novo – adquirido por D. Leopoldina – era José. Em verdade, era mulato; filho de uma negra com um homem branco desconhecido. Parecia muito aceado e tinha boa aparência. Era de poucas palavras e muito respeitador. Obedecia não só as ordens da viúva, mas também de todos os seus filhos; tanto os residentes na casa quanto os que iam de visita. Ao todo eram cinco: Maria da Graça, Maria do Socorro, Joaquim, João Matias e Leopoldo o caçula.

José trabalhava calado, obedecia calado e ouvia calado. Ouvia muito, pode-se observar. Conversas tolas na maioria do tempo e conversas bem interessantes de tempos em tempos, principalmente as que aconteciam entre João Matias e sua irmã mais velha Maria da Graça, quando esta vinha em visita à casa da mãe em companhia de seus dois pequenos. Conspiravam e planejavam; contra tudo e contra todos, especialmente contra a genitora. Pintavam-na insana e incapaz de administrar seu patrimônio, o que não era verdade, mas muito vantajoso para os dois. Os outros três não ficavam muito atrás, mas não era muito espertos, nem sutis.

O crioulo temia por D. Leopoldina, tão cercada de abutres. Decidiu usar as palavras que economizava todos os dias para alertá-la, mas seu coração de mãe cegava-a. Terminou em uma casa de saúde, sem nada nas mãos. Não tinha mais terras, não tinha mais negros, não tinha mais filhos, mas tinha José que lhe visitava e oferecia companhia, mesmo com poucas palavras. Era um excelente escravo. Um excelente escravo fiel.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Cidades Secas - Monteiro Lobato

Chamava-se João Teodoro, só. O mais pacato e modesto dos homens. Honestíssimo e lealíssimo, com um defeito apenas: não dar o mínimo valor a si próprio. Para João Teodoro, a coisa de menos importância no mundo era João Teodoro.

Nunca fora nada na vida, nem admitia a hipótese de vir a ser alguma coisa. E por muito tempo não quis nem sequer o que todos ali queriam: mudar-se para uma terra melhor.
Mas João Teodoro acompanhava com aperto de coração o depericimento visível de sua Itaoca.
- Isto já foi muito melhor, dizia consigo. Já teve três médicos bem bons - agora só um e bem ruinzote. Já teve seis advogados e hoje mal dá serviço para um rábula ordinário como o Tenório. Nem circo de cavalinhos bate mais por aqui. A gente que presta se muda. Fica o restolho. Decididamente, a minha Itaoca está se acabando...
João Teodoro entrou a incubar a idéia de também mudar-se, mas para isso necessitava dum fato qualquer que o convencesse de maneira absoluta de que Itaoca não tinha mesmo conserto ou arranjo possível.
É isso, deliberou lá por dentro. Quando eu verificar que tudo está perdido, que Itaoca não vale mais nada de nada de nada, então arrumo a trouxa e boto-me fora daqui.
Um dia aconteceu a grande novidade: a nomeação de João Teodoro para delegado. Nosso homem recebeu a notícia como se fosse uma porretada no crânio. Delegado, ele! Ele que não era nada, nunca fora nada, não queria ser nada, não se julgava capaz de nada...
Ser delegado numa cidadezinha daquelas é coisa seríssima. Não há cargo mais importante. É o homem que prende os outros, que solta, que manda dar sovas, que vai à capital falar com o governo. Uma coisa colossal ser delegado - e estava ele, João Teodoro, de-le-ga-do de Itaoca!...
João Teodoro caiu em meditação profunda. Passou a noite em claro, pensando e arrumando as malas. Pela madrugada botou-as num burro, montou no seu cavalo magro e partiu.
- Que é isso, João? Para onde se atira tão cedo, assim de armas e bagagens?
- Vou-me embora, respondeu o retirante. Verifiquei que Itaoca chegou mesmo ao fim.
- Mas, como? Agora que você está delegado?
- Justamente por isso. Terra em que João Teodoro chega a delegado, eu não moro. Adeus.
E sumiu.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Lá no bordel

Lá no bordel onde trabalho, sou a preferida.
Não faço exigências, não cobro carinho, nem tento subir na vida.
Não falo, não beijo, não peço nem um gole,
Só quero um cigarro na despedida.

Não quero mudar, mas não digo que sou feliz
Já tive sonhos, já fui menina
Virei mulher e agora uso roupas encardidas
Foi como Deus quis, me tornei uma simples meretriz

prévia

a marcha dos desvairados tomou as ruas
todos enfileirados, como um exército
cheios de tudo que não representa nada
prontos pra apagar a moral
e acender o carnaval