Olhares vagos dizem mais que qualquer palavra de desprezo

domingo, 8 de agosto de 2010

O casamento de Euclides II

Nascia mais um dia de garoa pela janela do quarto de Euclides. Com o travesseiro por cima da cabeça, ele ignorava o toque do despertador. Achava-se impaciente naquela manhã e só de imaginar ter de olhar a cara de Janeth no café-da-manhã, seu estômago embrulhou-se.
Casou-se por interesse e nada mais. Foi a clássica união da fome com a vontade de comer. Janeth já beirava os trinta e ainda estava na prateleira. Euclides não tinha nada além da sua beleza jovial e seu sorriso encantador. Como nem tudo é perfeito, Janeth cansou-se de não ser amada e Euclides cansou-se de nem tentar. Se aturavam dia após dia, conversando apenas o trivial e se vendo quanto menos fosse possível. Dividiam uma casa, uma cama e um filho. Nada mais que isso; todo o resto pertencia a Janeth. Euclides continuou tendo nada além de seu sorriso encantador, pois a beleza jovial já havia expirado o prazo de validade. Não era mais galante, nem cheio de si. Não tinha mais a velha mania de ser o maestro do tempo; na atual conjuntura, acontecia o contrário: o tempo era o maestro de sua vida. E as chuvas se tornaram cada vez mais escassas.